REBELLION AND RESISTANCE IN THE IBERIAN EMPIRES, 16TH-19TH CENTURIES.

Talisman/Talisman (ES) | Talismã/Talisman (PT)

Author: Luisa Stella de Oliveira Coutinho Silva

Affiliation: Max Planck Institute for Legal History and Legal Theory

https://doi.org/10.60469/q5xd-wt41


Rafael Bluteau, no Vocabulário Portuguez e Latino (Bluteau 1721), refere a falta de menção do vocábulo nos autores portugueses. Entretanto, relata que o uso de talismãs era uma prática popular dos habitantes do reino. Em referência à sua origem, Bluteau especulou ser esta uma palavra derivada do árabe e tomado do grego vulgar Teleman, que, segundo alguns, significava conservação. Não sabendo ao certo, sugeriu que a palavra também podia derivar do persa Talisman, que significava constelação, ou mesmo de Talismna, proveniente do talamascis literis, que são caracteres misteriosos ou cifras desconhecidas que são utilizadas pelos feiticeiros e significa vultos e sombras de espíritos infernais. Por fim, talismã foi definido como figura, caractere ou imagem de signo celeste, constelação ou planeta, gravada em pedra ou metal para receber influências destes mesmos astros. Bluteau provê vários exemplos. Arremata, por fim, lembrando que os adeptos da arte Talismanica atribuem influências celestes nos corpos sublunares e que algumas matérias são mais facilmente influenciáveis pelos mesmos, produzindo efeitos extraordinários parecidos com milagres. Entretanto, opina ele mesmo para à associação dessas práticas com a ciência do demônio, quem conhece bem as propriedades desses elementos e pode manipulá-lo mais eficazmente. Com este embasamento, no seu Diccionario da Lingua Portugueza (Silva 1789), Talisman foi definido como peça de metal fundida com figuras dos atros ou constelações gravadas que possuem virtudes extraordinárias.

Em espanhol, no Diccionario de la lengua castellana, da Real Academia Espanhola (RAE 1739: 216), Talisman é definido pela primeira vez em 1739 como “Caracter, figura, ò imagen gravada, ò formada de algun metal com correspondencia à los Signos Celestes, que dicen, à aprehenden, que dominan em ellos por lo que supersticiosamente les atribuian alguna virtud prodigiosa, y usaban de ellos los Magos, e Hechiceros, al modo de los que despues se llamaron Nóminas, y otras figuras supersticiosas.” Aponta-se, aí, para uma possível origem persa ou árabe, ou do grego vulgar Talesman, ou ainda ao latim Astralis imago. O verbete é repetido nas edições de 1780 (RAE 1780), 1783 (RAE 1783), 1791, 1803, 1817, 1822.

Terreros y Pando (1788) associa os talismãs ao charlatanismo, caracterizando-os por imagens gravadas consideradas “vanas” (RAE 1788: 576) às quais astrólogos e “charlatanes atribuyen virtudes aravilhosas” (Terreros y Pando 1788: 576). 

Na edição de 1822 do Diccionario de la lengua castellana, Talisman também é atribuído ao Doctor de la ley mahometana, (RAE 1822: 783). Em 1825, as duas definições são explicadas conjuntamente no dicionário de Núñez De Taboada, que define talisman como “Carater, figura ò imagen adivinhatória, y supersticiosa. Doctor de la ley mahometana.” (Núñez De Taboada 1825: 1440). Esta dupla definição também se repete no Diccionario de la lengua castellana de 1832 (RAE 1832), 1837 (RAE 1837) e 1843 (RAE 1843), mas desta vez sem conter a atribuição aos magos e feiticeiros. Finalmente, este conceito chega ao novo dicionário de Vicente SAlvá (1846).

No fim do século XIX, o etnógrafo e arqueólogo português Leite de Vasconcelos diferenciou amuletos de talismãs por considerar este último como um objeto de propriedades mais gerais. Entretanto, dedicou seus estudos ao desenvolvimento histórico e arqueológicos dos amuletos.

Na Historiografia do império luso-brasileiro, Ronaldo Vainfas, Calainho e Laura de Mello e Souza mencionam as bolsas de mandingas como talismãs utilizados no Brasil colonial, embora também usem indistintamente a palavra amuleto como sinônimo. Dizem Calainho (183) que “O porte dos amuletos ou talismãs protetores era particularmente popularizado, difundido até entre os não muçulmanos.” Pessoas portadoras destas bolsas foram julgadas pela Inquisição portuguesa. Segundo Souza (1986), as bolsas eram confeccionadas com tecido, quase sempre na cor branca, e tinham principalmente a finalidade de proteger seus portadores contra ferimentos causados por facas ou tiros. No seu interior, eram encontrados itens como pedra de corisco, olho de gato, enxofre, pólvora, uma bala de chumbo, um vintém de prata, um osso de defunto e os famosos escritos que deveriam ser colocados sob a pedra de altar. Souza associa os talismãs às bolsas de mandinga, de onde provinham dos objetos reunidos dentro da bolsa ou do próprio talismã. Vainfas (2001: 368) defende que a bolsa de mandinga “congregava a crença europeia nos talismãs com fetichismos de origem africana e mesmo ameríndia. Daí a sua enorme difusão na América Portuguesa e entre as mais variadas camadas sociais, sobretudo no século XVIII”, servindo assim também como resistência cultural.


REFERÊNCIAS

Dicionários

Bluteau, Rafael, Vocabulario Portuguez e Latino, Lisboa, Officina de Pascoal da Sylva, Impressor de Sua Magestade, 1721, volume 8.

Núñez De Taboada, M., Diccionario de la lengua castellana, para cuya composición se han consultado los mejores vocabularios de esta lengua y el de la Real Academia Española, últimamente publicado en 1822; aumentado con más de 5000 voces o artículos que no se hallan en ninguno de ellos, 2 vols, París, Seguin, 1825.

Real Academia Española, Diccionario de la lengua castellana compuesto por la Real Academia Española, reducido a un tomo para su más fácil uso. Madrid . Joachín Ibarra, 1780.

Real Academia Española. Diccionario de la lengua castellana, en que se explica el verdadero sentido de las voces, su naturaleza y calidad, con las phrases o modos de hablar, los proverbios o refranes, y otras cosas convenientes al uso de la lengua [...]. Compuesto por la Real Academia Española. Tomo sexto. Que contiene las letras S.T.V.X.Y.Z. Madrid. Imprenta de la Real Academia Española, por los herederos de Francisco del Hierro, 1739.

Real Academia Española. Diccionario de la lengua castellana compuesto por la Real Academia Española, reducido a un tomo para su más fácil uso. Segunda edición, en la qual se han colocado en los lugares correspondientes todas las voces del Suplemento, que se puso al fin de la edición del año de 1780, y se ha añadido otro nuevo suplemento de artículos correspondientes a las letras A, B y C. Madrid. Joachín Ibarra, 1783.

Real Academia Española, Diccionario de la lengua castellana compuesto por la Real Academia Española, reducido a un tomo para su más fácil uso. Tercera edición, en la qual se han colocado en los lugares correspondientes todas las voces de los suplementos, que se pusieron al fin de las ediciones de los años de 1780 y 1783, y se han intercalado en las letras D.E. y F. nuevos artículos, de los quales se dará un suplemento separado. Madrid. Viuda de Joaquín Ibarra, 1791.

Real Academia Española (RAE), Diccionario de la lengua castellana compuesto por la Real Academia Española, reducido a un tomo para su más fácil uso. Quarta edición. Madrid, Viuda de Ibarra, 1803.

Real Academia Española (RAE), Diccionario de la lengua castellana por la Real Academia Española. Quinta edición, Madrid, Imprenta Real, 1817.

Real Academia Española (RAE), Diccionario de la lengua castellana por la Real Academia Española. Sexta edición, Madrid, Imprenta Nacional, 1822.

Real Academia Española (RAE), Diccionario de la lengua castellana por la Real Academia Española. Séptima edición, Madrid, Imprenta Real, 1832.

Real Academia Española (RAE), Diccionario de la lengua castellana por la Real Academia Española. Octava edición, Madrid, Imprenta Nacional, 1837.

Real Academia Española (RAE), Diccionario de la lengua castellana por la Real Academia Española. Novena edición, Madrid, Imprenta de D. Francisco María Fernández, 1843.

Salvá, Vicente, Nuevo diccionario de la lengua castellana, que comprende la última edición íntegra, muy rectificada y mejorada del publicado por la Academia Española, y unas veinte y seis mil voces, acepciones, frases y locuciones, entre ellas muchas americanas [...],  París, Vicente Salvá, 1846.

Silva, António Moraes, Diccionario da lingua portugueza composto pelo padre D. Rafael Bluteau, reformado, e accrescentado por Antonio de Moraes Silva natural do Rio de Janeiro, Lisboa, Na Officina de Simão Thaddeo Ferreira, Lisboa, 1789, vol. 2.

Terreros y Pando, Esteban de. Diccionario castellano con las voces de ciencias y artes y sus correspondientes en las tres lenguas francesa, latina e italiana [...]. Tomo tercero (1767). Madrid, Viuda de Ibarra, 1788. 

Bibliografia
Calainho, Daniela Buono, Metrópole das Mandingas. Religiosidades negra e Inquisição portuguesa no antigo regime, Rio de Janeiro, Garamond, 2008.

Souza, Laura de Mello e, O diabo e a terra de Santa Cruz. Feitiçaria e religiosidade popular no Brasil colonial, São Paulo, Companhia das Letras, 1986.

Vainfas, Ronaldo, Dicionário do Brasil Colonial (1500-1808), Rio de Janeiro, Objetiva, 2001.

Vasconcelos, Leite, Sur les amulettes portugaises, Lisbonne, Imprimeire Nationale, 1892.