REBELLION AND RESISTANCE IN THE IBERIAN EMPIRES, 16TH-19TH CENTURIES.

Mocambo (PT)

Author: Matheus Serva Pereira

Affiliation: ICS-Universidade de Lisboa

https://doi.org/10.60469/gvnj-xg41


Entre os séculos XVI e XIX, a palavra mocambo ganhou distintos significados que estiveram associados a presença de comunidades africanas ou afrodescendentes em Portugal e no Brasil. No dicionário de Bluteau (1716, v 5: 522, 2), mocambo era “o nome de um dos bairros de Lisboa” onde havia existido “uma quantidade de casinhas de pescadores e negros”. Segundo o dicionário, no Brasil a palavra tinha um significado ligeiramente distinto, designando “as aldeias de uns negros repartidas em choupanas”. Na versão reformada do dicionário (Bluteau e Silva 1789, v 2: 88, 1), produzida por um “natural do Rio de Janeiro”, a referência à Lisboa desapareceu e mocambo passou a ser identificado como “quilombos, ou habitações feitas nos matos pelos escravos pretos fugidos do Brasil”. A adoção do novo sentido para a palavra foi justificada com base na definição empregada pelo Governador do Brasil, em 1612, que fez uso da palavra mocambo para designar agrupamentos de escravizados africanos foragidos (Meneses: 523-524). A bibliografia atribui diferentes origens para a palavra. Segundo Gomes (2005: 10), mocambo vem das “línguas bantu da África Central e Centro-ocidental”, onde significaria acampamento militar e moradias.

Para Sweet (2003: 237), mocambo vem especificamente do kimbundu, tendo o sentido de esconderijo. Enquanto para Lopes (2004: 443), deriva do kicongo, onde significaria “cumeeira”, “telhado”. Como aponta Schwartz (1992: 103-128), os mocambos no Brasil não foram comunidades isoladas da sociedade colonial. Apesar de fixados em regiões de difícil acesso, estavam localizados nas proximidades de cidades e das plantations. Os mocambos foram constantemente perseguidos pelas autoridades coloniais, que os consideravam uma ameaça à ordem social vigente. Paulatinamente, no século XVIII, a palavra mocambo foi substituída por quilombo para designar agrupamento de escravizados fugitivos. Os principais motivos para essa mudança foram o impacto da ocorrência de Palmares (finais do século XVI até o primeiro quartel do XVIII) e as transformações sociopolíticas causadas pelos imbangalas (grupo guerreiro) na África Central. Mocambos e quilombos foram experiências fundamentais para a formação do campesinato negro brasileiro nos séculos XIX e XX.


REFERÊNCIAS

Dicionários
Bluteau, Rafael, Vocabulario Portuguez e latino (volume 5: letras K-N), Lisboa, Officina de Pascoal da Sylva, Impressor de Sua Magestade, 1716, https://digital.bbm.usp.br/handle/bbm/5449

Bluteau, Rafael; Silva, Antônio de Morais, Diccionario da lingua portugueza composto pelo padre D. Rafael Bluteau, reformado, e accrescentado por Antonio de Moraes Silva natural do Rio de Janeiro (Volume 2: L - Z), Lisboa, Officina de Simão Thaddeo Ferreira, 1789, https://digital.bbm.usp.br/handle/bbm/5413

Fontes impressas
Meneses, Diogo, Rezão do Estado do Brasil no Governo do Norte Somente asi como o teve Dõ Dioguo de Meneses até o anno de 1612, in Sluiter, Engel, “Report of the State of Brazil, 1612”, The Hispanic American Historical Review, 29 (4), 1949, p. 518-562, https://www.jstor.org/stable/2508764?origin=JSTOR-pdf

Historiografia
Gomes, Flávio. Palmares. Escravidão e liberdade no Atlântico Sul, São Paulo, Contexto, 2005.

Lopes, Nei, Enciclopédia brasileira da Diáspora Africana, São Paulo, Selo Negro, 2004.

Schwartz, Stuart. Slaves, Peasants, and Rebels. Reconsidering Brazilian Slavery, Urbana and Chicago, University of Illinois Press, 1992.

Sweet, James, “The Hidden Histories of African Lisbon”, in J. Cañizares-Esguerra, M. D. Childs, J. Sidbury (eds), The Black Urban Atlantic in the Age of the Slave Trade, Philadelphia, University of Pennsylvania Press, 2013, 233-247.