REBELLION AND RESISTANCE IN THE IBERIAN EMPIRES, 16TH-19TH CENTURIES.

Bernarda (PT)

Author: Ana Paula Medicci

Affiliation: Universidade Federal da Bahia

https://doi.org/10.60469/6s8n-5a84


Vocábulo que significa movimento que congregava “tropa e povo”, próprio do contexto vintista luso-brasileiro. O termo, que só aparece nos dicionários em fins do século XIX (Silva 1890, I: 335) como sinônimo de “revolta popular, alevantamento de povo, motim”, está presente no debate que permeou o movimento de emancipação política do Brasil.

Provavelmente, originou-se de “bernardice”, em referência à imagem de ignorância atribuída aos frades bernardos, corrente no mundo português do período e que foi retomada pelo ministro de D. João VI, António de Vila Nova Portugal, diante da Revolução Liberal de 1820.

A palavra circulou em panfletos no Rio de Janeiro e em outras províncias, entre 1821 e 1823, para desqualificar movimentos políticos iniciados pelas tropas e que insuflavam o “povo” em defesa de ideais atrelados à defesa de interesses “portugueses” em detrimento dos “brasileiros”, no contexto dos conflitos que levaram às Independências do Brasil.

Duas bernardas ocorreram no Rio de Janeiro durante o ano de 1821, promovidas pela Divisão Auxiliadora Portuguesa em apoio às Cortes portuguesas, dando início ao movimento constitucionalista na Corte fluminense e sendo inicialmente bem acolhidas pelo “povo”. O mesmo não ocorreu entre 11 e 12 de janeiro de 1822, quando a Divisão se voltou contra o regente D. Pedro depois do “Fico” do dia 9; vindo a sofrer forte oposição das tropas brasileiras e de diversos setores civis, redundando na expulsão dessa tropa do Brasil.

Outras manifestações com o mesmo caráter ocorreram em diversas províncias. Uma das mais conhecidas é a “Bernarda de Francisco Inácio”, ocorrida em São Paulo em maio de 1822, quando dois grupos, um mais ligado à regência de D. Pedro e outro atrelado as Cortes de Lisboa, disputaram a presidência do governo paulista.

Em debate com os editores do periódico Regulador Brasileiro, assim se expressava Frei Caneca em 1823: “É sentença de Vmc. mesmo: ‘Merecem páo todos os que quebrantam os sagrados deveres de um cidadão; todos os que procuram dissolver os laços sociaes, que ligam os homens; todos finalmente que excitam a desconfiança entre os povos e o governo.’ [...]Que bella constitucionalidade a de Vmc.! Como se combina esta proposição com aquell´outra também sua: ‘É a lei que falla, é a lei que condemna o cidadão. Que sistema mais bello!’, fallando do constitucional. Que proposição mais anarchica, revolucionaria e horrível! A epocha da chegada dos seus papeis aqui coincide com a da desenvoltura do chamado batalhão ligeiro. Neste foram por muitas vezes vistos os apaniguados dos que trouxeram seus folhetos, aquelles que se encarregaram de os vender; e os mesmos, que os trouxeram, dirigiram as bernardas. E não será isto arvorar e fazer tremular a bandeira negra da anarchia?” (Caneca 1876, II: 332).


REFERÊNCIAS

Dicionários

Basile, Marcelo, “Bernarda”, In: OLIVERIA, Cecilia Helena de Salles e PIMENTA, João Paulo (orgs.), Dicionário da Independência do Brasil, São Paulo, Edusp-Edições BBM, 2022, p.130-132.

Impressões rebeldes. Glossário: “Bernarda”. https://www.historia.uff.br/impressoesrebeldes/glossario/#b

Silva, Antonio de Morais, Diccionario da Lingua Portugueza, I, 8ª ed., Rio de Janeiro, Editora – Empreza Litteraria Fluminense de A. A. da Silva Lobo, 1890. https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/242523

Fontes primárias
Caneca, Frei Joaquim do Amor Divino. Obras políticas e Litterarias de Frei Joaquim do Amor Divino Caneca. Colleccionadas pelo Comendador Antonio Joaquim de Mello. Tomo II, 1ª ed. Recife, Typographia Mercantil, 1876. https://digital.bbm.usp.br/handle/bbm/2662