REBELLION AND RESISTANCE IN THE IBERIAN EMPIRES, 16TH-19TH CENTURIES.

Perjúrio/Falso testemunho (PT)

Author: Indira Leão

Affiliation: CIDEHUS-Universidade de Évora

https://doi.org/10.60469/zef4-zs53


O Dicionário de Bluteau define mais detalhadamente “perjurar” como “quebrar o juramento que se tem feito” e “jurar falso, para enganar (...) o mesmo se entenda, com o que jura repentinamente por costume, sem reparar se he verdade, ou não, porque pecca mortalmente pelo perigo de perjurar, ainda que succeda ser verdade”. “Perjurio” é o crime de perjurar. “He faltar á fé, violar as leys da natureza, & de toda a sociedade humana, tirar do mundo o commercio, & exterminar a Religião”. Os gentios entendiam que “o perjurio era afronta, que o homem fazia aos deoses”.  “perjûro refere-se a “aquelle que quebrou o juramento” (Bluteau 1720, vol. VI: 433-435).

O Dicionário da Real Academia Española de 1737 refere que “perjurio” do latim perjurium é a culpa ou “delito de jurar falso, o el acto de perjurarse”. O “perjuro” (do latim perjurus) é quem jura falso ou se contradiz “declarando com juramento una cosa y despues outra, maliciosamente”. “Perjurar” do latim perjurare, pejerare é jurar falso “o faltar á la fé ofrecida en el juramento”. No caso de algum homem negar a verdade ou “perjurar, el Juiz pues que lo sobier mandelo prender e darle cien azótes”. “Perjurar” também significa “jurar mucho, ú por vicio, ú por añadir fuerzas al juramento, como maldiciendose” (RAE 1737, tomo V: 226). O Dicionário da RAE de 1788 acrescenta à entrada “perjuro” “el que falta á la fidelidad de su señor. V. pérfido, traidor” (RAE 1788, tomo III: 103). Estas definições mantêm-se até ao Dicionário da RAE de 1899.

Parte II: uso da palavra nas fontes da época e diferentes contextos históricos

“Perjúrio” não foi somente uma infração jurídica como também era considerado pecado na tratadística jurídica inquisitorial ibérica.

Apesar de na normativa e praxis inquisitorial não se usar muito o conceito de “perjúrio”, encontramos referências a “perjuros” e uso do verbo “perjurar” nos Regimentos de 1552 e 1613. Estas noções são usadas para classificar a “falsa e simulada confissão”, sendo que os “penitentes que negam a verdade” também incorrem em “perjuros”. Os conceitos mais utilizados nesta documentação e, inclusivamente, no Regimento de 1640 (tendo o significado equivalente a “perjúrio”) é o de “testemunho falso”, ou seja, “quem falta com a verdade”, incorrendo num castigo “rigoroso” que podia ser a sua entrega à justiça secular, açoites públicos, degredo para as galés e o uso de carocha com rótulo de falsário na apresentação pública no auto-da-fé (Regimento de 1640). “Falsário” também é encontrado na documentação para designar quem prestava falso testemunho. O Santo Ofício prezava pela verdade dos testemunhos dos réus e dos denunciantes, exortando-os sempre a “dizer somente a verdade, sem acrescentar nem diminuir nela cousa alguma, não levantando nem a si nem a outrem falso testemunho”.

Para a documentação inquisitorial espanhola, Margarita Martínez Escudero (2015) registou uma predominância no uso de “falso testimonio” e pouco uso do conceito “perjuro” (à semelhança do caso português). As testemunhas cometem “perjurio pues revocan una declaración anterior prestada bajo juramento”. O Santo Ofício espanhol exortava também o réu a que “diga y confiesse enteramente verdad de lo que se sintiere culpado, ò supiere de otras personas, que lo sean, sin encubrir de sí, ni dellas cosa alguna, ni levantar à sí, ni à otro falso testimonio: porque haziendolo assì, descargara su conciencia, como Catolico Christiano, y salvará su anima, y su causa sera despachada con toda la brevedad, y misericordia, que huviere lugar; donde no, se proveera justicia” (P. Garcia, Orden que comúnmente se guarda en el Santo Oficio de la Inquisicion, acerca del processar en las causas que en èl se tratan, conforme à lo que està proveìdo en las instrucciones antiguas y nuevas, Valencia, 1736, citação em Martínez Escudero, 2015: 454).


REFERÊNCIAS

Dicionários
Bluteau, Rafael, Vocabulario portuguez e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico, brasilico, com... / pelo Padre D. Raphael Bluteau, Coimbra, no Collegio das Artes da Companhia de Jesu), 1720, vol. VI. Pp. 433-435.

https://permalinkbnd.bnportugal.gov.pt/records/item/249107-vocabulario-portuguez-e-latino-aulico-anatomico-architectonico-bellico-botanico-brasilico-com

Real Academia Española (RAE), Diccionario de la lengua castellana, en que se explica el verdadero sentido de las voces, su naturaleza y calidad, con las phrases o modos de hablar, los proverbios o refranes, y otras cosas convenientes al uso de la lengua [...].  Compuesto por la Real Academia Española. Tomo quatro que contiene las letras O.P.Q.R., Madrid, Imprenta de la Real Académia Española, 1737. http://ntlle.rae.es/ntlle/SrvltGUILoginNtlle

Real Academia Española (RAE), Diccionario castellano con las voces de ciencias y artes y sus correspondientes en las tres lenguas francesa latina e italiana, su autor el P. Esteban de Terreros y Pando. Tomo Tercero, Madrid, en la imprenta de la viuda de Ibarra, hijos y compañia con licencia, 1788.  http://ntlle.rae.es/ntlle/SrvltGUILoginNtlle

Fontes impressas
Franco, José Eduardo & Assunção, Paulo de (2015). As metamorfoses de um polvo: religião e política nos regimentos da Inquisição portuguesa (sécs. XVI-XIX). Lisboa: Theya Editora.

Historiografia
Martínez Escudero, Margarita, La prueba procesal en el derecho de la Inquisición, dissertação de doutoramento em Historia Jurídica y de Ciencias Penales y Criminológicas, Universidad de Murcia - Departamento de Historia Jurídica y de Ciencias Penales y Criminológicas, 2015.