REBELLION AND RESISTANCE IN THE IBERIAN EMPIRES, 16TH-19TH CENTURIES.

Bando/Banda (ES) | Bando (PT)

Author: Arthur Curvelo

Affiliation: ICS-Universidade de Lisboa

https://doi.org/10.60469/a61g-wy69


Em português ou castelhano, “Bando” é uma palavra polissêmica. O primeiro significado que lhe dá o padre Raphael Bluteau é o de “pregão de guerra, a som de caixa, com pena imposta aos transgressores de alguma lei militar” (Bluteau 1728, v. 2: 32). Covarrubias fala de “pregón que se da, llamando algun deliquente que se ha ausentado” (Covarrubias 1611, v. 1: 237). A Real Academia Espanhola de Autoridades, em 1726, designava bando por “Edito, ley o mandato solemnemente publicado de orden superior (RAE 1726, t.1: 545). Estes e vários outros associam a palavra a uma disposição normativa do Antigo Regime ibérico que visa comunicar publicamente e garantir o cumprimento de uma ordem através da imposição de uma pena aos transgressores. A promulgação dava-se por um oficial de guerra nos espaços públicos de vilas e cidades, acompanhada do toque de caixas. Se a sua produção deriva, originalmente, de circunstâncias marciais, os bandos acabaram sendo utilizados por governadores e vice-reis do mundo ibérico para veicular disposições tematicamente variadas, que vão desde restrições ao comércio à circulação pública, por exemplo. Os bandos são típicas disposições normativas que se lançam para coibir ou punir deserções, fugas e outros atos de resistência aberta ou mesmo quotidiana. É assim que em 1740, por exemplo, o governador de Pernambuco proíbe com um bando que as pessoas escravizadas pernoitassem nas ruas do Recife depois das 21h dormindo fora da casa dos senhores ou que alugassem casas e quartos para o efeito, prática hoje conhecida como petit-marronage (AUC, CCA, 32: 630v). Por excelência, a publicação de bandos pode despoletar atos de resistência, como sucedeu durante um ajuntamento público dos moradores de Alagoas em 1677, em que estes declararam coletivamente o descumprimento de um bando do governador que ordenava a cessão dos seus escravos para carregar os mantimentos das tropas que iam atacar Palmares (AIHGAL, cx.1,mç 2, d.2).

Com ligeiras variações, o outro sentido da palavra Bando, em português, e Banda ou Vanda em castelhano, é o de “partido, partes, parcialidade” (Bluteau 1728, v.2, 32). Covarrubias fala de vanda de gentes como “ayuntamento y caterua de hombres que van adunados” (Covarrubias 1611, v.2: 1330), já o dicionário da Real Academia de Autoridades define banda como “parcialidad, o gente que favorece y sigue el partido de alguno” (RAE 1726, t.1: 545).

No contexto das resistências, bando é um grupo armado por parte de uma facção sediciosa. Armar um bando representa um meio de organizar a resistência aberta, sobretudo quando esta é encabeçada por poderosos locais. Em Portugal, desde 1340, o título 13 do regimento dos Corregedores das Comarcas estabelece expressamente o dever de conhecer e coibir os “bandos” e “se seguem desses bandos pelejas, ou [re]voltas, ou mortes ou outro mal, ou dano” (Ord. Afonsinas, Liv. 1, tt.XXIII). Na América Portuguesa, bandos são estas milícias armadas por particulares, normalmente compostas de escravos e homens pobres, que participam de sedições como a Guerra dos Mascates (Mello, 2003: 103). A formação destes bandos representa um meio particularmente eficaz de resistência às justiças. Muitos magistrados eram impedidos de avançar com as diligências de prisão, por exemplo, por não disporem de efetivos suficientes para confrontar régulos e seus bandos armados, principalmente nos sertões.


REFERÊNCIAS

Dicionários
Bluteau, Rafael, Vocabulario portuguez, e latino, aulico, anatomico, architectonico, bellico, botanico...: autorizado com exemplos dos melhores escritores portuguezes , e latinos; e offerecido a El Rey de Portugal D. Joaõ V, Coimbra, Collegio das Artes da Companhia de Jesu/ Lisboa, Officina de Pascoal da Sylva, 1712-1728. 8 v; 2 Suplementos. https://www.bbm.usp.br/pt-br/dicionarios/vocabulario-portuguez-latino-aulico-anatomico-architectonico/?q=bando

Covarrubias, Sebastián de, Tesoro de la lengua castellana o española, Madrid, Luis Sánchez, 1611. https://apps.rae.es/ntlle/SrvltGUIMenuNtlle?cmd=Lema&sec=1.0.0.0.0.

Real Academia Española, Diccionario de la lengua castellana, en que se explica el verdadero sentido de las voces, su naturaleza y calidad, con las phrases o modos de hablar, los proverbios o refranes, y otras cosas convenientes al uso de la lengua [...]. Compuesto por la Real Academia Española. Tomo primero. Que contiene las letras A.B, Madrid, Imprenta de la Real Academia Española, por los herederos de Francisco del Hierro, 1726. https://apps.rae.es/ntlle/SrvltGUIMenuNtlle?cmd=Lema&sec=1.0.0.0.0.

Fontes manuscritas
Arquivo da Universidade de Coimbra (AUC), Coleção Conde dos Arcos (CCA), Disposições dos Governadores de Pernambuco (1700-1746), tomo 2, Códice 32, fl. 630v.

Arquivo do Instituto Histórico e Geográfico Alagoano (AIHGAL), 2º Livro de Vereações de Santa Maria Madalena da Lagoa do Sul (1666-1681), caixa 01, maço 02, doc. 02.

Historiografia
Mello, Evaldo Cabral de, A fronda dos mazombos. Nobres contra mascates, Pernambuco, 1666-1715, São Paulo, Editora 34, 2003.